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sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Capitulo Quinze


Passei a maior parte da manhã de domingo zanzando pela casa. Meus pais tinham ido a uma exposição de arte e a casa estava quieta demais. Mais tarde deveria tomar conta de Nina, mas até lá não tinha nada para fazer. Percebi então como é triste para uma adolescente quando tudo o que ela tem pela frente é passar a tarde com uma garotinha de dez anos.


Por volta do meio-dia sentei ao computador para fazer uma redação que tinha de lição de casa. Mas meus dedos apenas passeavam pelo teclado, eu não encontrava nada a dizer. Pensamentos sobre a noite anterior rolavam pela minha mente, mas não conseguia organizá-los. Eu me sentia como se estivesse suspensa no ar, aguardando que alguma coisa acontecesse — só não fazia a menor idéia do que pudesse ser.

Quando a campainha tocou, voei escada abaixo. Naquela hora ficaria feliz em sentar e bater papo até mesmo com um vendedor ambulante qualquer. Qualquer coisa que me mantivesse ocupada.

Imediatamente meu humor melhorou quando vi o carro da Mel estacionado na frente de casa. Decidi contar a ela o que tinha acontecido entre Arthur e eu na noite anterior.

— Tenho uma novidade para contar que vai deixar você de boca aberta — disse ela assim que abri a porta.

— Fomos invadidos por extraterrestres? - sugeri enquanto pegava o casaco azul-marinho de sua mão.

— Os ETs não são nada em comparação com o que me aconteceu esta manhã — ela disse com os olhos brilhando.

Fomos até a cozinha, onde peguei dois refrigerantes para nós.

— Não faça tanto suspense! Diga logo!

Ela abriu a latinha de refrigerante.

— Estava lendo o jornal esta manhã, cuidando das minhas coisas. Quero dizer, não esperava que nada acontecesse durante todo o dia. Nada de nada.

—Quer fazer o favor de ir logo ao que interessa! — interrompi. — Não agüento tanto suspense.

— Arthur me ligou e convidou para sair com ele esta noite.

Tossi, engasgando com o refrigerante.

— Está brincando?

Ela balançou a cabeça.

— Não estou. Vamos sair para um jantar.

— Uau. — Senti como se tivesse acabado de levar um soco.

Mel me olhou nos olhos.

— Você não se importa, certo? Quero dizer, achei que tinha sido você que tinha dado um toque para ele.

Esforcei-me para sorrir

— Claro que não me importo. Só fiquei surpresa por ele não ter me dito nada, só isso.

— Você parece que ficou meio verde — ela falou, observando do meu rosto.

— Ei, sempre achei que vocês formariam um par maravilhoso. Fiquei muito alegre em saber. Até perdi a fala.

Mel sorriu de novo.

— Tudo bem. Vou acreditar em você. Então, tem alguma coisa que você possa me emprestar para vestir?

— Vamos encontrar a coisa certa. Quando Arthur vir você, Pérola Faria vai ser apenas uma lembrança distante.

Apesar de minhas palavras, eu me sentia vazia. Verdade que tinha sido minha a idéia de dizer a Arthur para sair com a Mel. Porém acreditava que ele nunca faria isso.

Uma coisa era certa. Não poderia contar a ela que tinha beijado o Arthur. Podia até imaginar os dois rindo sobre isso no jantar. "Coitada da Lua", pensaria Arthur, "ela nunca vai arranjar um namorado".

Estremeci. Não podia deixar, nem por um instante, que Arthur e Mel percebessem como eu ficaria chateada por eles estarem saindo juntos.

— Vamos lá para cima — convidei, ficando em pé. — Não temos nem um minuto a perder.

— Obrigada, Lua. Sabia que poderia contar com você para um apoio moral.

Ela me abraçou e quando olhei para seu rosto vi que estava radiante.

Em meu quarto, comecei a procurar pelo armário. Peguei um vestido rodado verde e passei para a Mel.

— Experimente este — sugeri.

— Quando me olhar, lembre-se de que esta noite vou estar usando o sutiã milagroso — disse Mel alegremente. — Imagine dois dedos a mais aqui em cima.

Atirei-me na cama e fiquei a observá-la enquanto se despia.

— Esse tal sutiã é o seu seguro — comentei.

Ela deu uma risada.

— Como ficou?

— Muito legal. — Ela já tinha colocado o vestido, que definitivamente parecia bem melhor nela do que em mim. — Na verdade, melhor você ficar com ele de uma vez. O corte cai muito melhor em você.

Mel se revirava na frente do espelho.

— Você acha que o Arthur vai gostar dele?

— Claro que vai.

Mel foi até meu espelho de corpo inteiro e examinou seu rosto:

— Acho que tem uma espinha aparecendo no meu queixo.

— Não, não tem nada — disse eu, procurando parecer feliz e encorajadora.

Mel sentou-se na minha cadeira.

— Estou ficando nervosa — confessou.

— Não tem motivo. Você é um milhão de vezes mais legal que qualquer garota com quem Arthur já tenha saído.

De repente Mel endireitou-se na cadeira.

— Ei, você conhece o Arthur melhor do que ninguém. Me dê umas dicas do que devo fazer para que ele goste de mim.

Fechei os olhos por um momento, pensando. Como resumir tudo o que sabia de Arthur em poucas frases? Mentalmente repassei todos os pequenos detalhes que poderia dizer a ela sobre meu melhor amigo. Respirei fundo.

— Ele odeia picles no hambúrguer. Não diga a ele que você se acha gorda. Ele não importa que você cante dentro do carro, mesmo que sua voz pareça uma vaca mugindo. Ele gosta de representações. Se você não conseguir adivinhar qual personagem ele esta tentando imitar, diga que é o Elvis Presley. Quando um pequeno músculo perto dos olhos dele começa a pular ele está tentando não demonstrar que está zangado...

Agora que tinha começado não podia parar. Senti como se tivessem aberto as comportas de uma barragem. Mel estava sentada em silêncio, me observando. Ela parecia estar prestando atenção, e então continuei.

— Sua cor favorita é o verde. Ele é fã de música de discoteca. À noite ouve rádio. Odeia garotas superficiais, embora você nunca viesse a saber disso a julgar por sua última namorada. Ele prefere morrer a trabalhar em um escritório. Ele é engraçado quando...

— Lua! Você está passando bem? — Mel perguntou de repente.

Ela fazia um gesto com a mão para que eu interrompesse a enxurrada de frases que desembestara a falar. Eu tinha quase me esquecido de que minha amiga estava ali.

— O quê? Oh, desculpe. Acho que falei mais sobre o Arthur do que você queria saber.

Mel estava ocupada tirando as cutículas. Vi que mordeu o lábio e depois deu uma olhada para mim.

— Você está apaixonada por ele, não está?

Falara delicadamente mas cada palavra martelou em minha cabeça.

— O quê? — gaguejei.

Para ocupar as mãos, peguei um travesseiro e o abracei. Mel ergueu a sobrancelha:

— Você me ouviu. Acho que você está apaixonada por Arthur Aguiar.

— Esta é a coisa mais idiota que já ouvi — retruquei, desviando meu olhar. — Não seja ridícula.

— Lua, o modo como você falava sobre ele, é como se...

— Eu não estou apaixonada pelo Arthur. E fim de papo. Sabia que minha voz soava alterada, mas não consegui me controlar.

— Se você tem certeza...

— Claro que tenho certeza. Agora pegue o vestido e vá se arrumar. Preciso sair.

Algum tempo depois fechei a porta da frente com cuidado, atrás de Mel. Fiquei na entrada, sem me mexer, prestando atenção no silêncio da casa vazia. "Eu não estou apaixonada pelo Arthur", disse a mim mesma. Quando as palavras ecoaram em minha cabeça quase acreditei que era verdade.

Sábado à noite Nina estava muito agitada e quase precisei arrastá-la pela escada acima na hora de dormir. Ela tinha estado na casa de Marcy Stein, numa festa de meninos e meninas, na noite anterior, e queria me contar cada um dos detalhes de tudo o que tinha acontecido no grande evento.

— Então Peter Ross colocou um cubo de gelo nas minhas costas — disse ela, enquanto relutava em vestir um pijama de flores amarelas.

— E o que você fez? — Peguei a escova e fiz sinal para que ela se sentasse na beirada da cama.

— Primeiro eu gritei. Depois dei o troco. Todo mundo riu tanto que pensei que a gente ia fazer xixi na calça.

Ela ria só de lembrar.

— Vê se fica quieta. Tem um nó no seu cabelo. — Enquanto a penteava, esperava pela continuação da história.

— Ainda não contei a melhor parte — ela falou.

— E tem mais?

Apesar do mau humor, não pude deixar de rir. O entusiasmo de Nina pela vida era contagioso.

Ela fez que sim com a cabeça.

— Só vou contar para você se prometer não dizer nada a mamãe e papai — falou com expressão séria.

— Juro que não conto.

Ela se virou para mim, e não pude deixar de perceber que estava quase estourando de vontade de contar seu segredo.

— Nós brincamos de girar a garrafa.

— Não!!

Tentei parecer escandalizada o melhor que pude. Tinha certeza de que Nina esperava por uma reação dramática.

— Sim! Os meninos eram uns tipos tão nojentos que pensei que eu ia vomitar.

— Quem você teve de beijar? — perguntei.

Ajudei-a a levantar-se da cama para poder arrumar as cobertas.

— Peter Ross! Eca!

Nina fez cara feia e colocou a língua para fora. Dei uma risada:

— Estou certa de que você sobreviverá. E pode ser que até venha a querer beijá-lo algum dia.

Ela sacudiu a cabeça, protestando com uma careta.

— Nem em um milhão de anos!

— Se você é quem diz — comentei ligeiramente, dando-lhe um beijo de boa-noite.

Estiquei o braço e apaguei a luz de cabeceira. Quando estava saindo do quarto, porém, Nina sentou-se na cama e acendeu a luz.

— Ei, Lua.

— O que foi? — perguntei colocando as mãos na cintura.

— Você acha que vou me casar com Peter Ross, agora que nos beijamos?

— Sim, e vocês vão viver felizes para sempre.

Apaguei a luz esperando que ela não reparasse no tom amargo de minha voz.

Saí do quarto, certa de que em poucos minutos ela estaria dormindo e sonhando com Peter "Eca" Ross. Estava contente por não ter tido coragem de lhe dizer que, depois da quinta série, os romances começavam a ir por água abaixo. Ela iria descobrir isso logo.

Uma vez tendo descido as escadas, não havia muita coisa com que me distrair. Finalmente peguei um saco de salgadinhos e liguei a televisão na MTV. Enquanto comia os salgadinhos, desejava que Arthur e Mel estivessem se divertindo. Eu esperava de verdade, de verdade mesmo, que eles estivessem tendo os melhores momentos de suas vidas.

Depois de uma hora de vídeos e músicas, estava chateada, irritada e morrendo de curiosidade. Não podia esperar mais para saber como tinha sido o encontro de Mel. Olhei para o relógio e pensei que ela já deveria ter voltado para casa. Quanto tempo teria durado o jantar?

O telefone de Mel tocou três vezes antes que a mãe dela atendesse. Sabia que a sra. Fronckowiak dormia cedo, e a voz dela me pareceu meio grogue e ligeiramente aborrecida. Se Mel estivesse em casa, ela seguramente não se daria ao incomodo de atender. Coloquei o aparelho no gancho.

Mel não tinha voltado para casa, o que significava que ela e Arthur estavam ainda juntos. O encontro havia sido um sucesso então. Em seguida haveria novos encontros. E mais. Logo eles estariam de mãos dadas em lugares públicos. E eu, no máximo, estaria segurando vela. Sozinha e indesejada.

Nunca tinha conseguido saber do Arthur qual era a dele em relação a Mel. Nossa amizade não englobava esse tipo de pressão. Mas não seria eu quem ficaria no caminho da felicidade dele, ou da Mel.

— Vou deixar o caminho livre — falei para a TV. — Será a melhor solução para todos nós.

Um comentário:

  1. adorei o esse capitulo posta mais por favor pq eu adoro essa web e venho todos os dias no seu blog pra ver se vc posto mais entao por favor posta maiiis

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